Este
capítulo trata sobre os tipos sanguíneos e sua determinação. Pessoas têm tipos
sanguíneos diferentes como tem a cor dos olhos ou dos cabelos diferentes. Os tipos
de sangue são caracterizados pelos tipos diferentes de antígenos que cada um
possui na superfície das hemácias. Dessa forma, o tipo sanguíneo é determinado
ao se mostrar qual antígeno o caracteriza. O antígeno se torna evidente através
de sua reação com seus anticorpos pares. Assim, um antígeno “A” é mostrado
através de sua reação com o “anti-A”. Este teste é chamado de “determinação do
tipo sanguíneo”.
No corpo humano, há aproximadamente 300
tipos diferentes de antígenos distribuídos por 102 diferentes sistemas. Um
sistema é uma coleção de antígenos sanguíneos que juntos definem sua
característica. Os antígenos de vários sistemas sanguíneos podem se combinar de
tantas formas que é quase impossível encontrar duas pessoas não relacionadas
carregando o mesmo tipo de sangue.
Os sistemas de grupos sanguíneos
De
todos os sistemas de tipagem do sangue, o sistema ABO e o Rhesus (Rh) são
particularmente importantes quando se transfunde o sangue. Assim a tipagem do
sangue normalmente especifica os tipos ABO e Rhesus (Rh), por exemplo, O Rh positivo ou A Rh negativo, normalmente resumidos em O+ ou A-.
O sistema
ABO
É
caracterizado por dois antígenos chamados antígeno-A e antígeno-B. Os antígenos
do sistema ABO são parte da superfície de todas as células no corpo. Enquanto o
tipo AB tem ambos antígenos, o tipo O não tem nenhum deles.
Os
antígenos ABO são geneticamente determinados pelos genes A, B, ou O. Enquanto o
gene-O não causa a formação de nenhum antígeno, os genes-A formam antígenos-A e
os genes B formam antígenos-B.
Os
genes são encontrados nos cromossomos de ambos os pais (por exemplo, A paterno
e O materno) e constituem o que chamamos genótipo ABO. O fenótipo é a
característica que o gene gera, podendo ser cabelos loiros, olhos castanhos ou
um tipo sanguíneo. Usando ainda o exemplo do genótipo AO o fenótipo é o A,
porque o gene-O não forma nenhum antígeno e o gene-A forma antígenos-A. Quando
há apenas antígenos-A, o fenótipo é A e o tipo sanguíneo, por conseqüência também
é o A.
A
tabela abaixo mostra a inter-relação entre os genes ABO herdados dos pais; o
genótipo ABO; a incidência dos antígenos ABO nos diferentes tipos; os fenótipos
ABO; a incidência dos tipos ABO na população Brasileira; e a incidência dos
anticorpos do sistema sanguíneo: anti-A e anti-B nos quatro tipos diferentes de
sangue.
Gene Paterno
|
Gene materno
|
Genótipo
|
Antígeno
|
Fenótipo
|
Incidência
|
Anticorpo
|
O
|
O
|
OO
|
Nenhum
|
O
|
45%
|
Anti-A
e Anti-B
|
A
|
A
|
AA
|
A
|
A
|
42%
|
Anti-B
|
O
|
A
|
OA
|
A
|
A
|
42%
|
Anti-B
|
A
|
O
|
AO
|
A
|
A
|
42%
|
Anti-B
|
B
|
B
|
BB
|
B
|
B
|
10%
|
Anti-A
|
O
|
B
|
OB
|
B
|
B
|
10%
|
Anti-A
|
B
|
O
|
BO
|
B
|
B
|
10%
|
Anti-A
|
B
|
A
|
BA
|
A
e B
|
AB
|
3%
|
Nenhum
|
A
|
B
|
AB
|
A
e B
|
AB
|
3%
|
Nenhum
|
Os antígenos A e B do sistema ABO, tem
anticorpos respectivos: Anti-A e Anti-B. Uma das teorias é a de que eles são formados
porque somos expostos aos antígenos A e B do bacilo Coli, entre outros
estímulos da natureza. Coli é uma bactéria que é encontrada nas entranhas de
todos os humanos (entre outros locais) e que não causa doença. Ela aparece
aproximadamente três meses depois do nascimento e assim que a pessoa é
infectada pelo bacilo Coli, desenvolve os antígenos A e B. Se a pessoa já
possuir estes antígenos, eles não serão considerados estranhos e não haverá a
formação de anticorpos. Se, no entanto, não os possuir, o sistema imunológico
será afetado e formará anticorpos. Por exemplo, se a pessoa não tiver o
antígeno-A, se tornará imune pelo antígeno-A estranho e formará o anti-A, o
mesmo acontecerá com o antígeno-B e a formação de anti-B. Ou seja, anticorpos
ABO sempre serão formados contra qualquer antígeno ABO que não esteja presente
no organismo (veja a tabela).
Misturar
o sangue de duas pessoas com tipos ABO diferentes pode até causar a morte. Isso
porque, os anticorpos ABO de uma pessoa agirão contra os antígenos ABO da
outra. Por exemplo, se você misturar o sangue de uma pessoa do tipo O com uma
do tipo A, o sangue O, que inclui anti-A, reagirá contra os antígenos-A do
sangue A. Esses tipos de sangue são chamados de incompatíveis.
Se você transfundir glóbulos vermelhos de
tipos ABO incompatíveis (com antígenos capazes de reagir com os anticorpos no
sangue do paciente), você terá uma reação chamada hemolítica à transfusão. Essa
reação consiste na destruição dos glóbulos vermelhos, com liberação de
substâncias no sangue que fazem com que a pressão sanguínea diminua e com que
os glóbulos vermelhos se rompam (hemólise). Reações hemolíticas sérias podem
causar a morte.
É
possível transfundir sangue O a todos os tipos ABO, sangue A aos tipos A e AB e
sangue B aos tipos B e AB.
Na
prática, um paciente deveria receber sangue apenas de doadores com o mesmo tipo
ABO que o seu, de forma a evitar complicações na transfusão resultante de resíduos
de plasma na mistura de glóbulos vermelhos e soro. Entretanto, em casos de
baixa de estoque, é possível ministrar apenas glóbulos vermelhos na pessoa.
O sistema
Rhesus
Diferente
dos antígenos do sistema ABO, os antígenos do sistema Rhesus são encontrados
apenas na superfície das hemácias e não na de outras células. Há cerca de 50
antígenos Rhesus diferentes mas apenas 5 são importantes quando uma transfusão
é aplicada.
O
mais importante é o antígeno-D. Assim, quando o tipo Rhesus é determinado,
apenas este antígeno é levado em consideração. Se você tiver o antígeno-D você
é Rhesus positivo (RhD pos). Se você não tiver o antígeno-D, você é Rhesus
negativo (RhD neg). Cerca de 81% da população brasileira é Rhesus positivo e
cerca de 19% Rhesus negativo (veja a tabela abaixo).
Gene Paterno
|
Gene materno
|
Genótipo
|
Antígeno
|
Fenótipo
|
Incidência
|
Anticorpo
|
D
|
D
|
DD
|
D
|
RhD
pos
|
80,5%
|
Incapaz
de formar Anti-D
|
d
|
D
|
dD
|
Não
D
|
RhD
neg
|
19.5%
|
Capaz
de Formar anti-D
|
D
|
d
|
Dd
|
||||
d
|
d
|
dd
|
A
tabela mostra a conexão entre os genes-S herdado dos pais; o genótipo-D; a
incidência de antígenos-D nos diferentes tipos Rhesus; o fenótipo-D ou o tipo
sanguíneo Rhesus; a incidência dos tipos de Rhesus na população brasileira; e a
incidência dos anticorpos anti-D no sistema Rhesus de sangue, no caso da
influência por glóbulos vermelhos RhD positivos de outra pessoa.
O sistema Rhesus de tipo sanguíneo é
importante porque o antígeno-D é muito imunogênico, o que significa que ele
induz facilmente a formação de anticorpos em quem precisa. Normalmente, uma
pessoa não cria anticorpos Rh a não ser quando exposta previamente aos glóbulos
vermelhos de outra pessoa, porque os antígenos Rhesus são encontrados apenas na
superfície destes. Em circunstâncias normais é possível aplicar a primeira transfusão
sanguínea sem levar em consideração o sistema Rhesus.
As
características do sangue foram primeiramente descobertas no macaco-Rhesus e
por isso nomeadas em sua homenagem. A descoberta foi realizada um pouco antes
do início da Segunda Guerra Mundial.
Se
o sangue RhD positivo foi transfundido em uma pessoa RhD negativo, que tenha o
anticorpo anti-D em seu plasma, este pode causar sérias complicações
hemolíticas na transfusão. O anti-D também é a causa principal da séria doença
chamada ‘icterícia fisiológica do recém-nascido’, na qual o anti-D da mãe
Rhesus negativo passa pela placenta ao feto Rhesus positivo e se une aos
glóbulos vermelhos deste que são danificados e se partem. Neste caso, a mãe
desenvolveu o anti-D em gestações anteriores e/ou transfusões sangüíneas prévias.
Para
evitar a formação de anticorpos anti-D perigosos, pacientes que são Rhesus-D
negativos devem receber apenas sangue Rhesus-D negativo. Em caso de falta de
sangue Rhesus-D negativo, exceções podem ser feitas, mas apenas se o paciente
ainda não tiver o anti-D, nem exista a possibilidade de gravidez no futuro (por
exemplo, em mulheres após a menopausa).
Na
primeira imunização (primeira vez que uma pessoa RhD negativo encontra com o
antígeno-D), o sistema imunológico da pessoa reagirá vagarosamente, uma vez que
ainda não existem anticorpos contra o anti-D circulando no plasma. Demorará
algum tempo até que os linfócitos se tornem ativos e se desenvolvam. O anticorpo
só será formado meses depois da transfusão ou da gravidez.
Na próxima vez que o corpo for exposto ao
antígeno-D, já terá acontecido uma imunização. Assim, haverá reação entre o
antígeno-D e as células de memória do sistema imunológico, e entre o anti-D
formado e os glóbulos vermelhos estranhos, que serão destruídos rapidamente.
Lembro-me de
ouvir mais de uma vez quando criança que o meu tipo sanguíneo (O neg) era o
“doador universal” e por isso, muito importante. Embora meus pais nunca tenham
doado sangue ou me incentivado diretamente, acho que apenas saber isso foi o
suficiente.
Pouco depois de
completar 18 anos, fiz minha primeira doação e lembro até hoje de descer as
rampas da faculdade me sentido uma heroína. Nunca mais parei, dôo pelo menos
uma vez ao ano e acabei também me tornando uma voluntária do sangue, trabalhando
para divulgar essa causa vital.
Letícia Côrtes Ferreira
A
distribuição dos tipos sanguíneos na população brasileira:
Tipos
|
Fatores Rh
|
||
Soma
|
( - )
|
( + )
|
|
O
|
45%
|
9%
|
36%
|
A
|
42%
|
8%
|
34%
|
B
|
10%
|
2%
|
8%
|
AB
|
3%
|
0,5%
|
2,5%
|
Total
|
100%
|
19,5%
|
80,5%
|
Resumo e questões
Os
dois sistemas de tipo sanguíneo mais importantes são o ABO e o Rhesus. Os
antígenos do sistema ABO são encontrados na superfície de todas as células do
corpo, em bactérias, e nas plantas. Os antígenos Rhesus são encontrados apenas
na superfície dos glóbulos vermelhos.
Herda-se
os genes ABO e Rhesus de cada um dos pais e estes dois genes determinam qual o
genótipo de cada pessoa. O genótipo indica quais foram os genes herdados. Os
genes determinam quais os tipos de antígenos que uma pessoa tem. Os antígenos
determinam qual o tipo de sangue (também chamado fenótipo). Assim, o tipo
sanguíneo se torna uma expressão dos antígenos que o corpo formou. Da mesma
forma que o corpo forma anticorpos contra os antígenos estranhos, o corpo forma
os anticorpos de tipo sanguíneo contra os antígenos de tipo sanguíneo
estranhos.
Como
os antígenos do tipo ABO não são encontrados apenas em humanos, mas na natureza
– por exemplo nos bacilos Coli – entramos todos em contato com esses ‘estranhos’
antígenos ABO muito cedo em nossa vida, formando anticorpos contra eles. Em uma
transfusão, o sangue de mesmo tipo ABO que o do paciente é aplicado, caso
contrário a reação entre o anticorpo do paciente e o antígeno do doador nos
glóbulos vermelhos causará uma complicação hemolítica a transfusão. Os glóbulos
vermelhos transfundidos são rapidamente destruídos, causando uma ameaça a vida.
Entre
outras coisas, o sistema Rhesus consiste de antígenos D que induzem a criação
do anticorpo anti-D. Como o antígeno Rhesus-D é encontrado apenas nos glóbulos
vermelhos, a única forma do antígeno entrar no corpo é através da gravidez
(quando uma pequena parte do sangue do feto é transferida para a mãe) ou de
transfusões sanguíneas. Devido à grande habilidade do antígeno-D de induzir a
formação de anticorpos, o risco de uma imunização é grande se a pessoa que é
Rhesus negativa receber o antígeno-D em seu corpo.
- Como se chamam os antígenos que
determinam o seu tipo ABO?
- Como você recebe os anticorpos A
e B em seu sangue quando ainda é bem pequeno?
- Em quais casos você pode se
tornar imune a formação do anti-D?
- Descreva a inter-relação entre
genótipo, fenótipo e tipo sanguíneo.
- O que é uma complicação hemolítica na transfusão?
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